domingo, 2 de agosto de 2009

Capítulo 3 - A grande mudança

Em 1994, alguma coisa se transformava naquele pequeno café do Bixiga. Mesmo com música ao vivo, o movimento continuava fraco e, nessa época, meus sócios originais, João Ricardo e Beto, já não queriam mais ter a obrigação de vir ao bar. Realmente, vida noturna não era a deles . Isso acabou resultando na venda de suas "partes" pra mim, no meio do ano (com prestações a perder de vista). Como os dois tinham amizade com a Rozana, minha atual sócia, pagavam-na do bolso para substituí-los na gerência noturna, rodiziando comigo nas noites em que eu tinha que estar no meu outro bar.

Quem conhece a Rô sabe do seu inconformismo com situações adversas, e da sua enorme energia e vivacidade. Não deu outra: numa fria noite de sexta-feira (dia em que tínhamos mais público) ela armou uma apresentação do cantor Toninho Nascimento - que atualmente é regular freqüentador do Raul Gil - com uma outra cara. Nada das chamadas "entradas" - como são chamados os períodos de 45 min que os músicos fazem nos bares, retornando após 15 min de intervalo. A idéia era dar um clima de "show", sem intervalos; algo mais ritualístico, mais magnético.

Ela agitou. Fez divulgação junto aos clientes habituées, telefonemas, cartazes, etc.

E funcionou: graças a essa iniciativa, nascia - sem sabermos - a "casa de shows Villaggio Café" - ainda um pequeno embrião do que viria pela frente.

Aos poucos, esse projeto foi crescendo, passando a se chamar "Sexta-Especial" e a ter uma programação definida antecipadamente. Fomos atrás de novos nomes: Yvette Matos, Renato Braz, Mário Gil, alguns músicos do extinto bar Boca da Noite com trabalho próprio, e por aí afora.

Durante a semana mantivemos os músicos da casa: Izabêh, Cacá, Maurício Lyra, Ione Papas e Ronaldo Rayol, Élio Camalle e, acabando de chegar de Minas, Ceumar (ela mesma). Além do chorinho de domingo à tarde e sábado à noite - claro.
A dupla Ione Papas & Ronaldo Rayol nasceu no Villaggio, e até hoje faz sucesso

Desde 1993, a gente contava com o competentíssimo Moisés Santana na assessoria de imprensa, parceria que durou por muitos anos. E eu, em casa, havia montado um cadastro de clientes para mandar a programação pelo correio, já que e-mail ainda era uma coisa que quase ninguém tinha. Criava o folheto no computador, bem feitinho, com fotos escaneadas, letras bacanas - coisa fina -, xerocava e postava. Fazia também cartazes bem legais pra colar na porta de entrada e paredes.

Com essa nova fase, tivemos que reformar o Villaggio. O balcão antigo resistiu por mais um tempo, mas em fevereiro de 95 construímos o palco - que era um pouco menor (ainda... ) do que é hoje - e, em fevereiro de 96, o modesto - mas aconchegante - camarim, coisa que nenhuma casa pequena tinha, e que foi uma idéia da Rô, após assistir um show do Elomar no saudoso Armazém do amigo Oswaldinho Viana. Ela viu o mestre num cantinho, esperando a hora de entrar no palco, e percebeu o quanto era importante um espaço privativo para os artistas dentro de uma estrutura de bar. Topei a idéia, a arquiteta e cantora Maria Bonafé bolou o projeto e transformamos uma parte do depósito no camarim que existe até hoje. Os artistas adoraram aquilo - que passou a ser um diferencial do Villaggio Café, e continua sendo.

Paulatinamente, fomos investindo em equipamentos de som: uma mesa nova aqui, alguns microfones ali, caixas melhores. Mas não tínhamos capital para vôos maiores, era tudo nacional ainda. O importante era que funcionava, e a gente passava nossa boa intenção para os músicos.

Todo esse envolvimento com música, no dia-a-dia, mexeu com nossas vidas. Sem perceber, havíamos sido "picados" pela mosca do "show-business". Num caminho sem volta, a cada semana a gente pensava num nome novo. Pesquisava, saía na noite pra conhecer gente, corria atrás. Aos poucos, fomos pegando "cancha", e os artistas nos conhecendo.

Em 17 de junho de 95, aniversário de 3 anos do Villaggio, trouxemos o nome mais conhecido que até então tinha pisado em nosso recém-criado palco: Lula Barboza. Até pela novidade junto aos clientes, sucesso estrondoso.

Por coincidência (será?...), foi nessa mesma data meu último dia como funcionário do Banco do Brasil, após 17 anos de carreira. Pedi demissão para trabalhar exclusivamente com música (ê, coragem!...).

E não paramos com nossas sextas-feiras: vieram Maria Alcina, Evaldo Gouveia, Zé Luiz Mazziotti, Milton Edilberto, Dayse do Banjo, Zérró Santos, Daisy Cordeiro, Jica y Turcão, Paulinho Nogueira, e muitos outros.
O Villaggio Café passava a ser conhecido em São Paulo. Chico César, despontando na Rádio Musical, se apresentou para a casa lotada no final de 95. Em 96, trouxemos o então desconhecido Zeca Baleiro por duas oportunidades, despertando nossa vocação para lançar novos talentos. E não paramos mais.

Foi, realmente, uma época estimulante. O contato com o meio artístico se revelou uma grande novidade em nossas vidas, já que nunca havíamos mexido com isso. Abriu nossas mentes, aumentou nossa sensibilidade, criou perspectivas, trouxe novos relacionamentos. Um mundo novo, sem dúvida.

Nessa época, todos os shows, via-de-regra, seguiam o formato voz-e-violão, até pelo tamanho do palco. Mas, novamente - como uma sina - algo iria se transformar. Mais exatamente em janeiro de 1997, com a temporada de Filó Machado - recém-chegado da França, onde vivia - e sua "imensa" banda de quatro músicos.

Mas isso fica pro próximo capítulo.

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