domingo, 2 de agosto de 2009

Capítulo 2 - O choro na calçada

Pois é: casa aberta, começou o sufoco. A partir da inauguração, tentamos manter o objetivo inicial, que era fazer um bar/café sem música, apenas um local agradável para bate-papo, comidas e bebidas. Durante quase um ano mantivemos esse esforço; os amigos e colegas do BB prestigiavam, mas clientela - mesmo - estava difícil, nada além de pessoas da vizinhança e de algumas empresas próximas.
Só amigos, no dia do impeachment do Collor

Nessa época, o Villaggio abria também de dia, na esperança de atingir um público de cafezinho e lanches rápidos. Não funcionou e, com o baixo retorno, aumentavam ainda mais as despesas. Até que o Ricardo Vanil, amigo de infância que trabalhou por um pequeno período como gerente da noite, deu seu veredicto: sem música ao vivo seria difícil colocar e manter gente na casa, já que o Bixiga tinha essa tradição de bares musicais. Já desconfiávamos disso, e o baixo faturamento reforçava essa impressão. Dessa forma, mesmo a contragosto, colocamos músicos à noite: primeiro o (saudoso) Cacá, depois o Isabêh, a Magic Band e o Jairo, fazendo MPB no esquema de entretenimento, ou seja, música de barzinho. Deu uma melhorada, mas ainda era insuficiente.
Em maio de 1993, no entanto, a sorte bateu à nossa porta: Arthur Bernardo, líder do grupo Choro Seresta & Cia. nos procurou com uma proposta inusitada. Estava, há tempos, de olho o movimento da feira de domingo, e visualizou seu regional de choro tocando a partir da hora do almoço, na calçada. Ora, uma idéia dessas não se recusa...Topamos, e inauguramos o "chorinho aos domingos", do lado de fora do bar.

Foi na mosca: logo no primeiro dia, lotação total, o povo saiu da praça da feirinha e atravessou a rua, em peso. Nos domingos seguintes continuou lotando, mais e mais. Em poucas semanas virou um "point": matéria da Vejinha, reduto de globais e jornalistas, turistas e muita gente bonita. Somente instrumental no início, o regional depois acolheu as maravilhosas cantoras Ana Bernardo (irmã do Arthur) e Ione Papas, que se revezavam e agitavam a platéia.

A música começava às 11h e ia até às 18h; depois esse horário foi se acomodando para mais tarde - até porque era impossível parar tão cedo: uma galera imensa se aglomerava em frente, a rua ficava cheia de gente em pé, esperando mesa, bebericando e curtindo a música, o maior astral. Acabava a feira e os expositores se juntavam ao público da casa. Sonia Braga veio duas vezes, Zé Ketti dava canjas regulares, toda hora tinha uma novidade. Tudo perfeito, inclusive em termos de faturamento (claro!...). O grupo de choro passou a ser fixo aos sábados à noite também, a pedido dos clientes.Essa grande festa durou uns três anos, sucesso total. Mas, como não há bem que sempre dure, os bares vizinhos - obviamente - resolveram nos copiar. Era o início do fim: o cruzamento da música das três casas agrediu e acabou por afastar, paulatinamente, o público, num processo lento e doloroso. Foi muito difícil aceitar uma perda dessas, e tentamos fazer a concorrência ver que seria ruim para todos, sem resultado. A ganância falou mais alto, e as pessoas sacaram isso; ninguém gosta de freqüentar ambientes com clima pesado.

Quando o movimento caiu de vez, reduzimos a quantidade de dias, passando a ser somente um domingo por mês, até que ano passado decidimos parar definitivamente, pra preservar, ao menos, a lembrança de tudo aquilo. Nunca mais recuperamos aquelas mágicas tardes de domingo, que ficaram na memória e no coração de muita gente. Até hoje aparecem clientes antigos lembrando dos momentos vividos, casais que se conheceram no Villaggio, jovens que são hoje adultos nostálgicos, amigos e mais amigos que não acharam mais nada parecido em São Paulo.

Voltando um pouco no tempo, em meados de 1994 começamos a mesclar os músicos da casa que tocavam à noite, de quarta a sábado, com os shows de artistas, às sextas-feiras - o que chamamos de projeto Sexta Expecial, idéia da minha (então) gerente (e hoje sócia) Rozana Lima. Mas... isso fica pro próximo capítulo.

Nenhum comentário: